«Não conheces, leitor, o vale de Arouca?... Pois apressa-te a visitá-lo; que poucas paragens florescerão no país tão como aquela deleitosas e amenas, tão exuberantes de vida, tão pródigas de encantos e de frescura. A uma e outra margem do pitoresco rio Arda alastram-se feracíssimos campos de cultivo, que na primavera revestem em massa a cor deliciosa da esmeralda. Ali se aprumam rumorejantes os salgueiros, com a sua trémula folhagem bicolor; a vinha contorce as suas nodosas varas em mudas atitudes de desespero; árvores de fruto aos centenares matizam de tons corados, apetitosos, vivos, aquela extensa monotonia verde, longa, vitoriosa e tersa como a fita de uma grã-cruz; e na orla, um pouco elevados, os castanheiros verdenegros ostentam vaidosos a sua corpulência hercúlea, com uma floração ridente a salpicar-lhes a coma de claro, qual se foram marqueses empoados para alguma solene recepção. E este fecundíssimo torrão, este riquíssimo tesouro rural, tão farto de produções mimosas, tão rico de matizes e de perfumes, tão fresco e tão salutar, guarda-o vigilante e zelosa uma aprumada serrania, que de perto o cinge pelo norte, pelo nascente e pelo sul, erguendo-se em torno austera, rígida e quase inacessível, e deixando apenas ao poente um ingresso estreito e mais seguro, como tomada de justo ciúme pela sonegação daquela angustiada preciosidade.» Abel Botelho, in "O Occidente. Revista Ilustrada de Portugal e do Estrangeiro",
VI, 1884, p. 268 e 269
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